Será o fim do Milagre da Contribuição Única?

O chamado “Milagre da Contribuição Única” surgiu durante o período de transição da Reforma da Previdência (EC nº 103/2019) e, em certos casos, aumentou significativamente o valor da aposentadoria. Entretanto, a Turma Nacional de Uniformização (TNU) discute sua validade no Tema 353.

TÓPICOS

O que representa o Milagre da Contribuição Única?

O “milagre” consiste em calcular o valor da aposentadoria, principalmente a aposentadoria por idade, com base em apenas uma contribuição de alto valor. A Emenda Constitucional nº 103/2019, que entrou em vigor em 13/11/2019, abriu essa brecha. Posteriormente, a Lei nº 14.331/2022, vigente desde 05/05/2022, cancelou essa possibilidade.

Assim, entre 2019 e 2022, alguns segurados pediram que o cálculo da aposentadoria considerasse apenas uma contribuição. Contudo, isso ocorreu em pouquíssimos casos, já que o segurado precisava ter apenas uma ou poucas contribuições entre julho/1994 e a data do pedido de aposentadoria. Portanto, a situação era rara.

Como surgiu a tese combinada?

A Reforma da Previdência trouxe outra regra que, combinada com a contribuição única, ampliou o alcance da tese. Essa regra permite que o segurado descarte o excesso de tempo de contribuição além do mínimo exigido.

Por exemplo, se a aposentadoria por idade exige 15 anos de contribuição e o segurado possui 20, ele pode descartar 5 anos. Normalmente ninguém faz isso. Entretanto, ao aplicar a regra da contribuição única, o cenário muda.

Imagine um segurado com 20 anos de contribuição: 15 antes de 1994 e 5 depois. Se ele não descartar nada, usará todos os 5 anos posteriores a 1994 para calcular a média. Como as contribuições anteriores a julho/1994 não entram na conta, o valor final fica baixo. Por outro lado, se entre esses 5 anos houver uma contribuição muito alta, o segurado pode descartar as demais e manter apenas essa. Dessa forma, o valor da aposentadoria aumenta consideravelmente. Essa revisão, chamada de contribuição única, aguarda julgamento na Justiça.

Quem pode se beneficiar?

O “Milagre da Contribuição Única” favorece segurados que:

  • Contribuíram bastante antes de julho de 1994.
  • Receberam salários baixos na maioria das contribuições posteriores a 1994.
  • Cumpriram os requisitos de idade mínima e 15 anos de contribuição entre 13/11/2019 e 04/05/2022.

Nesses casos, bastava realizar uma contribuição de alto valor, próxima ao teto do INSS, antes de pedir a aposentadoria. Assim, o segurado se beneficiava da tese.

Além disso, muitos segurados que não fizeram essa contribuição alta ainda podem ter direito à revisão, caso descartem os meses ruins. É exatamente essa possibilidade que o Tema 353 da TNU avalia.

Por que isso altera o valor do benefício?

A diferença no valor do benefício pode ser enorme. Em alguns casos, o valor da aposentadoria triplica ou quadruplica.

  • Antes da tese: o segurado com várias contribuições no salário mínimo tinha a média puxada para baixo.
  • Com a tese: ao descartar contribuições baixas e manter apenas uma de valor alto, a média do salário de benefício aumentava. Consequentemente, a aposentadoria ficava muito superior.

O que acontece na TNU (Tema 353)?

O Tema 353 da TNU busca definir se, entre a EC nº 103/2019 e a Lei nº 14.331/2022, o cálculo da aposentadoria por idade pode considerar apenas uma contribuição, sem divisor mínimo.

No processo PEDILEF 1018409-10.2021.4.01.3200/AM, a Juíza Federal Relatora Caroline Medeiros e Silva votou contra os segurados. Ela propôs a tese:

“Não é possível apurar o salário-de-benefício para aposentadoria por idade com apenas uma única contribuição no período entre a EC nº 103/2019 e a Lei nº 14.331/2022.”

Segundo a relatora, a tese viola os princípios contributivo/retributivo e o equilíbrio financeiro-atuarial da Previdência. Além disso, ela defendeu que o divisor mínimo deve ser observado, mesmo sem previsão expressa, porque considerar apenas uma contribuição fere a essência do sistema.

Entretanto, após o voto, o Juiz Federal Fábio de Souza Silva apresentou pedido de vista antecipado. Dessa forma, o julgamento foi suspenso. A decisão final da TNU terá impacto relevante, já que pode prejudicar milhares de aposentados que usaram ou pretendem usar essa tese para revisar ou obter benefícios mais vantajosos.

Marcelo Martins: Formado pela Universidade Estadual de Londrina no Paraná e pós-graduado em Direito do Estado pela mesma instituição. O mais importante, um advogado que se dedica à advocacia previdenciária há mais de 20 anos. Ao longo dessas duas décadas estendeu seu escritório por várias cidades do estado do Paraná e São Paulo, onde já patrocinou o direito de mais de 1000 aposentados e pensionistas, contra o INSS.